Meu nome é Lucas Schuab Vieira.
Eu nasci em 27 de outubro
de 1990. Nasci na roça em uma cidadezinha do interior de Minas Gerais, divisa
com o Espírito Santo. O nome da cidade era Presidente Soares e mudou-se para
Alto Jequitibá. Sou filho de uma família muito pobre. Meus pais passavam muita
dificuldade na roça. Quando minha mãe ficou grávida de min ela já tinha duas
filhas uma com oito anos e outra com cinco (minhas irmãs). Minha mãe tinha
apenas angu com feijão para comer quando estava grávida de min. Só dificuldade.
Meu pai trabalhava capinando mato nas lavouras de café. O dinheiro que ganhava
mal estava dando para comprar comida. De qualquer forma eu vim ao mundo. Nasci
pequenininho, fraquinho, mas vinguei.
A
situação continuou complicada, só dificuldade. Quando eu já tinha um ano e
pouco minha mãe ficou grávida de novo. Era o quarto filho que viria (meu irmão
mais novo). Ele também nasceu de forma bastante complicada, fraquinho. A
situação estava tão tensa na roça que meus pais resolveram vender o pouco que
tinha e migrar para a cidade em busca de conseguir pelo menos o que comer
direito. Ouviram falar que Campos do Jordão estava precisando de gente para
trabalhar e escolheram então tentar a sorte em Campos do Jordão. Para conseguir
comprar a passagem meu pai vendeu o pouco que tinha, chegou a vender,
inclusive, um cachorro que era da família.
Meus
pais sempre foram evangélicos. Chegando à Campos do Jordão meu pai pediu ajuda
em uma Igreja. Para nossa sorte teve um irmão da Igreja que - também tinha
vários filhos - que ficou comovido conosco e nos deixou morar na casa dele até
conseguirmos um lugar melhor e meu pai conseguir um emprego. A casa era no
Bairro Santa Cruz. Esse cidadão, pai de família, por nome João, que nos ajudou
foi um anjo em nossas vidas. Hoje ele mora no CDHU e é taxista em Campos, seu
nome é João. Ele dividiu até a comida de seus filhos conosco. Não sei te dizer
ao certo quanto tempo moramos, nessa casa com essa família. Nessa época meu
irmão (Wesley) ainda era um bebezinho com menos de um ano.
Não
sei quanto tempo demorou, mas meu pai conseguiu um emprego (Perto do saibreiro,
no Bairro Santa Cruz). Aí a gente soube que havia um antigo convento abandonado
que as pessoas que não tinham casa estavam invadindo para morar.
O antigo prédio das
freiras, por nome, Santa Clara, onde hoje é o CDHU da vila Albertina. Meu pai
então conseguiu invadir e ocupar um quarto também. Moramos por um bom tempo
nesse edifício coletivo. Nessa época minhas irmãs buscavam a merenda que
sobrasse na escola para a gente comer. Foi uma época muito difícil também. Meu
pai trabalhava a noite, não conseguia dormir direito, ficava muito estressado.
Com
muito esforço meu pai conseguiu comprar um barraco com um quarto só e um
banheiro, com chão de terra batida mesma. Mudamo-nos para esse barraco e aos
poucos meus pais foram construindo e melhorando essa residência. Essa casa fica
localizada na vila Albertina, viela Santa Clara, nº 33. Cresci nesse terreno.
Nessa época minha mãe começou a trabalhar direto. Praticamente fomos criados
nesse período pela nossa irmã mais velha.
Como eu cresci tendo a minha mãe
trabalhando fora eu sempre tive que me virar para tudo.
Meus
pais nunca deram muita importância para estudo. Nunca foram nas reuniões
escolares. Eu também não via sentido em estudar. Sempre fui um péssimo aluno. Ao
contrário do meu irmão que sempre foi bom aluno. Eu ia para a escola por causa
da merenda. Só fui levar a escola a sério no terceiro ano do ensino médio. Hoje
me arrependo muito de não ter estudado no passado.
Eu
cresci na rua, aquela Rua do CDHU da vila Albertina. Meu pai trabalhava a noite
e precisava de silêncio para dormir. Para não fazermos barulho para acordar ele
a gente chegava da escola, almoçava e já ia para a rua eu e o meu irmão.
Brinquei muito na rua. Televisão eu não tinha mesmo. Minha primeira TV foi aos
15 anos. Meu pai achava inútil gastar dinheiro comprando TV.
Aos
11 anos consegui meu primeiro emprego, era um emprego em um parque (Parque da
Floresta Encantada, indo para o Pico do Itapeva) onde eu ficava fantasiado de
papai Noel e tomando conta de uma casinha com decoração de natal. Trabalhei por
alguns meses nesse emprego. Trabalhava aos sábados e ganhava 07 reais por dia.
Aos
11 eu já tinha uma independência financeira grande. Já conseguia ter o meu
dinheiro e comprar as coisas que eu precisava, até material de escola para min
já era eu que comprava.
Depois
desse emprego eu comecei a intercalar entre os momentos na rua brincando, e os
trabalhos informais que eu fui fazendo. Dentre esses trabalhos encontram-se:
capinar quintais na vizinhança, trabalhar de ajudante de pedreiro, ajudante de
jardineiro, etc. Nesse período eu e meu irmão trabalhamos muito catando
materiais recicláveis na rua e nos lixões para vender. Pegávamos cobre,
latinhas de alumínio, garrafas PET e papelões para vender. Sempre íamos às
corridas de moto que aconteciam nesse terrenão que tem em frente ao portal da
cidade. Tudo sempre intercalando com os estudos que a gente, graças a Deus,
nunca abandonou.
Aos
14 eu consegui um emprego de babá onde eu ficava olhando dois moleques a noite
para a mãe deles e o pai poderem estudar. Foi um inferno, os moleques me deram
muito trabalho, não me respeitavam. Trabalhei seis meses de babá.
Depois
desse emprego de babá eu comecei a fazer bicos com mais frequência como
ajudante de pedreiro. Direto aparecia algum pedreiro disposto a me pagar 20 o
dia para ajudá-los aos finais de semana. Nesse período trabalhando em obras apareceram
alguns convites para eu começar a vender droga. Alguns homens me zoavam por estar
trabalhando em obra enquanto eu poderia estar ganhando bem mais dinheiro
vendendo droga. Mas, eu não tinha coragem de me envolver com venda de drogas.
Sempre me mantive no caminho certo.
Continuei
com os trabalhos em obras. Aos 15 trabalhei no mês de julho como barmen no
restaurante Tarundu, em Campos. Essa foi a minha primeira experiência em
restaurantes.
Já passei de tudo que
possa imaginar trabalhando em obra, coisas do tipo: dormir ao relento, ter que defecar
só no mato, comer muito mal. O pior momento da minha vida até agora foi quando
fiquei sozinho trabalhando em um lugar isolado, longe de tudo e o encarregado esqueceu-se
de levar almoço para min. Trabalhei o dia todo sem nem ter tomado o café da
manhã, foi o pior momento da minha vida, um inferno. Quando isso me aconteceu,
já tinha 16 anos.
Com
16 anos, em maio eu consegui emprego de novo no restaurante Tarundu, só que
desta vez como garçom. Trabalhei lá aos finais de semana. Nesse lugar eu fiquei
até os 18 anos. Trabalhei muito no tarundu. Entrei sem saber carregar bandeja
direito e sai como o garçom que mais vendia. Fiz muito sucesso trabalhando como
garçom. Dei-me muito bem nessa área. Aos poucos fui perdendo minha timidez que
era grande. Em resumo, eu me tornei um garçom muito bom, dos melhores que eu já
vi. Meu esforço e vontade de vencer naquela área renderam muitos frutos. Não
ganhava bem, mas ninguém naquele restaurante ganhava bem. Do meu contato e conversa com os turistas eu
fui me dando conta de que eu precisava estudar. Comecei a levar a escola a
sério.
Com
esse trabalho no restaurante eu consegui pagar todas as minhas despesas e ainda
criar uma poupança e guardar o que sobrava. No todo consegui juntar mais de 12
mil reais, em dois anos, trabalhando aos finais de semana, feriados e férias no
restaurante.
Até então eu nunca tinha
pensado em fazer faculdade, sempre achei que era preciso muito dinheiro para
poder estudar. Aí aconteceu de pelo fato de estudarmos em escola pública
poderíamos fazer o vestibular da UNESP pagando só 25 reais enquanto o
vestibular normalmente era 150. Eu pensei, vou fazer essa parada aí. EU nem
sabia que a UNESP era uma faculdade pública, fiz a inscrição. Na hora da
inscrição tinha que escolher um curso e um campus para poder estudar. Estava em
cima do prazo limite e eu não sabia o que colocar, aí pensei: como não vou
passar mesmo vou por qualquer coisa. Aí pensei, vou colocar História, escolhi
essa disciplina porque eu havia tirado uma nota boa na prova dessa disciplina
que eu tinha feito na semana na inscrição. Pensei, História deve ser fácil.
Estudei um pouco para o vestibular. Fiz o vestibular de forma descompromissada.
Na minha cabeça eu não passaria mesmo.
Para
minha surpresa saiu o resultado e eu passei. Eu nem acreditei, nem comemorei
muito também, afinal eu não sabia nem se iria mesmo fazer o curso, já que foi
uma escolha sem pensar. Mas, minha mãe ficou feliz e ficou querendo que eu fosse
fazer. Aí como eu tinha 12 mil na conta, resolvi tentar a sorte. Saí do emprego
no restaurante Tarundu e fui para Assis, com 18 anos.
Fiz
os quatro anos de faculdade. Tive que estudar muito. No início fiquei muito
assustado com o nível de dificuldade da faculdade, quase desisti. Continuei,
estudei muito, consegui tirar notas boas isso me animou a ir até o final. Ao
final de tudo eu terminei com a quarta melhor média de notas da minha sala. Nas
férias da faculdade quando eu voltava para Campos eu trabalhei em Hotéis lá.
Sempre como garçom. Fiz um projeto de pesquisa, meio sem pensar muito também.
Consegui passar na pós-graduação e estou fazendo o mestrado. Consegui a bolsa
FAPESP. Bom é
isso. Com certeza eu devo ter esquecido muita coisa, como eu esqueci que quando
trabalhava em obras de ajudante de pedreiro eu quase larguei a escola para
ficar trabalhando direto. Hoje eu agradeço por no passado não ter feito isso.
Eu me mantive focado em
levar a diante os objetivos de terminar os estudos, com isso deixei de lado os
relacionamentos.
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